"Adoção de processos ambiental e socialmente responsáveis não precisa encarecer o produto ou o serviço, desde que prática seja incluída no planejamento estratégico da companhia ."
O Cofundador da BrightHouse Joey Reiman é categórico ao afirmar, em seu livro “Propósito - Por que ele engaja colaboradores, constrói marcas fortes e empresas poderosas”, que a Fortune 500 deveria ser substituída pela Purpose 500.
A lista hoje em uso surgiu em 1955, época de prosperidade e otimismo nos Estados Unidos, quando o capitalismo guiado exclusivamente pelos lucros se apresentava como a melhor alternativa para levar o bem-estar à população.
Seis décadas depois, um número crescente de companhias percebeu que basear estratégias na rentabilidade não basta, sendo importante incluir um significado maior para as operações. O alinhamento estratégico com a sustentabilidade, que prevê questões ambientais e sociais, se não vende produtos diretamente, gera valor e fideliza consumidores.
Uma das preocupações de empresas que decidem repensar seus processos e suas práticas de forma a participar do movimento do capitalismo consciente paira sobre a questão de custo.
Muitas acreditam que, para se tornarem mais sustentáveis, precisarão aumentar os gastos e encarecer seus produtos e serviços - afinal, alimentos orgânicos e outros itens ambientalmente corretos costumam ser oferecidos nas prateleiras do comércio por valores mais altos do que as alternativas tradicionais.
Em um momento de crise econômica, esse direcionamento pode ser considerado arriscado. Especialistas e companhias que optaram pelo caminho, no entanto, garantem: essa crença se mostra, em muitos casos, apenas um mito.
Ainda existe uma cultura de premiunização das ofertas que agregam conceitos sustentáveis, mas, quando a filosofia é incorporada à estratégia da empresa, ela não precisa necessariamente encarecer os serviços ou produtos finais.
“Investir em sustentabilidade tende a resultar na diminuição de custos e na criação de novas oportunidades de crescimento. As ofertas não ficam automaticamente mais caras. Quando isso acontece, é porque a empresa está organizando seu portfólio para que seja visto como premium.
Muitas outras marcas não fazem isso, entregando sustentabilidade, mas cobrando o mesmo preço que itens similares tradicionais”, garante Jonathon Porritt, Cofundador do Forum For The Future, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Pressão dos custos
O especialista participou como palestrante da edição carioca do Sustainable Brands, evento global que ocorreu na semana passada.
Alguns produtos, como os oriundos do comércio justo - que garante o pagamento equilibrado aos diversos elos de uma cadeia de produção e distribuição -, passam a ser vendidos no varejo a preços mais altos como uma forma de ressaltarem sua diferenciação em relação às demais ofertas disponíveis nas prateleiras. Isso não está atrelado, necessariamente, a custos maiores de produção.
Algumas empresas, pelo contrário, conseguem até reduzir os valores aplicados em determinada oferta quando buscam alternativas social e ambientalmente responsáveis para suas matérias-primas ou suas práticas de produção. Isso ocorre quando as preocupações com o propósito consciente não estão limitadas apenas a um fator, ou um item, mas fazem parte de toda a estratégia da companhia.
Quando se olha apenas um atributo, a consequência é o encarecimento da produção. “Para inovar em sustentabilidade, é preciso adotar uma visão estratégica, que considere todo o Marketing mix. Por exemplo, a adoção de embalagens metalizadas costuma ser uma opção para empresas que querem passar uma sensação de mais qualidade para seus clientes.
Posso decidir não usa-la em prol de um plástico verde, que já é mais caro do que o tradicional. É preciso equilibrar o Marketing mix em prol do estratégico para manter a competitividade. Não posso pensar apenas o produto, mas todo o processo”, analisa Maya Colombani, Diretora Internacional de Marketing de Desenvolvimento e Líder de Sustentabilidade da L’Oréal Brasil, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Compromissos da L’Oréal
A companhia global lançou, em outubro de 2013, o programa "Compartilhando a Beleza com Todos" (Sharing Beauty With All, em inglês), que foca em quatro áreas: Inovação Sustentável, para reduzir a pegada ambiental de produtos e fórmulas; Produção Sustentável, para reduzir a emissão de gases do efeito estufa, o consumo de água e a geração de resíduos; Comportamento do Consumidor, para que eles estejam melhor informados e conscientizados dos impactos ambientais da empresa; e Compartilhar, que equilibra o crescimento da marca com o dos colaboradores, dos fornecedores e da comunidade.
Os compromissos preveem resultados até 2020, tais como a redução em 60% da pegada ambiental na produção mundial (usando como ano base 2005). Até 2014, a marca já havia alcançado índices como 65% de redução em emissões de gás carbônico, 38% em uso de água e 18% em geração de resíduos.
No Brasil, a empresa optou por criar uma comissão com funcionários de diversas áreas que estejam motivados em criar valor por meio de mudanças de comportamento. O grupo se reúne uma vez a cada dois meses e sugere projetos e revisão de práticas que possam ajudar a companhia a se tornar mais sustentável.
Uma das propostas posta em prática foi a construção de uma escola na fábrica localizada em São Paulo, na qual os colaboradores da L’Oréal atuam como professores voluntários. “Essa é uma forma de integrar a comunidade do entorno e a companhia, levando os moradores para dentro da unidade fabril.
O comitê trabalha a forma como vamos compensar toda a nossa cadeia de valor, criando um produto mais sustentável, educando o consumidor por meio dos pontos de contato com ele e incluindo as pessoas no sucesso da marca, sejam os colaboradores, os fornecedores ou as comunidades. O interessante é que não colocamos a sustentabilidade em uma caixinha, em um departamento fechado”, destaca Maya.
Potencial de escala
Em pesquisas, a companhia consegue mensurar os resultados em engajamento e fidelidade dos consumidores e também dos funcionários. Isso porque as pessoas tendem a amar empresas que compartilham dos mesmos valores que elas.
Gerar impacto e essa admiração também é o objetivo do Comitê Rio 2016, entidade não governamental, que utiliza apenas recursos privados e está envolvida com a organização dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do ano que vem. Os holofotes jogados sobre os dois dos três maiores eventos esportivos do mundo eleva em muito seu poder de transformação.
Diante disso, o comitê decidiu incorporar ao máximo práticas sustentáveis em sua operação. Mesmo muitos deles estando invisíveis aos olhos do público, os esforços vêm servindo para educar e capacitar toda uma cadeia de fornecedores que atuarão em parceria com a entidade.
O Comitê Rio 2016 optou por incluir condicionantes de sustentabilidade aos contratos e, antes das concorrências, vêm realizando workshops direcionados à cadeia produtiva. Somente no primeiro semestre deste ano, foram qualificadas mais de 300 empresas, entre fornecedoras ou candidatas a fornecedoras.
“Vimos que o setor de compras é uma das partes estreitas de nosso funil, pelo qual passam todos os projetos. Começamos a estratégia da sustentabilidade por ali, olhando para os cinco mil projetos em relação ao impacto social, ambiental e econômico e os classificando em quatro níveis de prioridade”, relata Tania Braga, Gerente Geral de Sustentabilidade, Acessibilidade e Legado do Comitê Rio 2016, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Muitas pessoas estão envolvidas nos Jogos, o que torna grandiosos os impactos das ações. O evento reunirá cerca de 15 mil atletas, 25 mil jornalistas, chefes de estado de 204 países, três milhões de espectadores, três mil oficiais técnicos, além de 150 mil profissionais, sendo 70 mil deles voluntários.
Trata-se da maior logística global temporária em tempos de paz. Para usar a paixão pelo esporte como mola propulsora para a transformação, o comitê optou por agir em parceria com os diversos fornecedores.
Flexibilizar sem abrir mão
Uma das exigências foi o de apenas comprar materiais de gráficas que fizessem impressão com tinta a água e que utilizassem alternativas ao PVC em banners. Não foi fácil encontrar negócios capazes de cumprir essas especificações, que estão inclusas em contrato.
Os peixes utilizados nas 14 milhões de refeições que serão servidas durante o evento também serão certificados como de origem sustentável. No fim do mês passado, a primeira remessa de 300 quilos chegou ao Rio para um evento teste.
Como muitos fornecedores não estavam preparados para atender às demandas, um dos desafios foi equilibrar alguma flexibilização, sem abrir mão do propósito. “Em um dos casos, uma pequena empresa do setor imobiliário do Rio Grande do Sul venceu a concorrência frente a multinacionais.
Ela tinha madeira de origem certificada, mas não contava com a certificação de sua cadeia de custódia, que era uma exigência. Normalmente, não teríamos aceitado sua vitória, mas combinamos que assinaríamos o contrato desde que o empreendedor se comprometesse por escrito a se certificar em dois meses.
De outra forma, não receberia pelo serviço após esse prazo. Buscamos ajuda do Sebrae e do FSC para apoiá-lo, e ele deu conta”, narra Tania.
A experiência do Comitê Rio 2016 também mostra que nem sempre um projeto sustentável é mais caro. “Por vezes, sai até mais barato. Muitas vezes matamos a ideia antes de cotar só porque achamos que a iniciativa terá um custo maior, o que não é verdade.
Um exemplo foi a iluminação em LED que colocamos em nossa sede. A lâmpada em si é mais cara, mas o projeto é diferente. Demanda menos unidades do produto do que se utilizasse a alternativa convencional.
As lâmpadas também não precisarão ser substituídas durante os quatro anos de uso do espaço, logo a opção também gerará economia com eletricistas. Nossa área de compras já está aculturada para usar o custo total de aquisição e não só o preço”, conta Tania.
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