"Cerca de 15 empresas do país estão internacionalizadas em San Francisco e outras 10 passam temporada de semanas ou meses na região, segundo estimativa da Apex."
Um dos principais desafios enfrentados por empreendedores brasileiros é o próprio ambiente de negócios do país, que contribui consideravelmente para a alta taxa de mortalidade de empresas em seus primeiros anos.
Segundo levantamento do Sebrae , quase um quarto das empreitadas sucumbem em apenas 24 meses de funcionamento. E se um ecossistema mais propício existisse, será que não só a sobrevivência, mas até a projeção das empresas seria diferente? Um grupo de empreendedores da área Digital acha que sim e decidiu ir atrás de um ambiente mais promissor: o Vale do Silício.
Assim como startups das mais diversas nacionalidades, as brasileiras já começam a se aventurar a abrir suas portas na região considerada a mais próspera do mundo para quem lida com tecnologia e negócios disruptivos.
Segundo estimativa da Agência Brasileira de Promoção de Exportação e Investimentos (Apex), há, neste momento, aproximadamente 15 empresas brasileiras internacionalizadas em San Francisco e outras 10 passando uma temporada de semanas ou meses na região, que abriga gigantes como Apple, Google, Intel, Microsoft, Facebook e
As vantagens encontradas na área da Califórnia vão muito além da simplificação da burocracia típica do Brasil. “O Vale do Silício é uma vitrine para o mundo, o que ajuda um produto ou uma startup a
O ecossistema também é muito produtivo, porque a região reúne desde investidores, a fornecedores e apoio governamental. Três meses, seis meses ou um ano por aqui podem levar a um resultado que não é conseguido em cinco anos no Brasil”, ressalta Guilherme Cerqueira, CEO da Worthix, em entrevista à TV Mundo do Marketing.
Busca pela projeção global
O empresário fundou, no Brasil, há mais de uma década, a QuestManager, que verifica e analisa as percepções e as experiências daqueles que adquirem produtos ou serviços de seus clientes. A ferramenta desenvolvida permite às companhias realizar pesquisas periódicas com consumidores pela internet. Agora, Cerqueira e sua equipe trabalham no desenvolvimento de um Worth Índex (o índex que mede o que vale a pena), por isso o nome Worthix.
O novo produto, que está em fase de testes como mínimo produto viável (MVP), ajudará especialmente micro e pequenos empresários - desta vez no Brasil e no Mundo, se depender do empreendedor. “Ficamos quase dois anos estudando o que levava o consumidor a decidir quando uma coisa vale a pena ou não.
Conseguimos chegar em um modelo de questionário para mais de 21 setores que, quando aplicado, mostra um report sobre por que aquela empresa vale a pena”, explica o CEO.
Hoje, o atribulado profissional de Marketing de empresas de pequeno porte se depara com uma página de pesquisa em branco, na qual tem que elaborar perguntas a serem feitas aos clientes de modo a entender o que está dando certo e errado em suas estratégias.
Com o Worthix, os atributos mais valorizados ficarão claros de forma mais simples, indicando para quais áreas os investimentos devem ser direcionados por afetarem mais a percepção do público-alvo. A trajetória no Vale do Silício está sendo registrada em uma espécie de “reality show” exibida no Facebook: a Restartup.
Espaço para negócios disruptivos
Outro empreendedor que também decidiu buscar o sucesso nas águas da baía de San Francisco foi Ariel Silva, fundador, há 11 anos, do Videolog, a primeira plataforma de compartilhamento de vídeos do mundo, lançada nove meses antes do YouTube.
“Na época, todo mundo comentou comigo que o meu maior erro era lançar o portal no Brasil, e eu aprendi. A ideia de vir para cá é para lançar um empreendimento disruptivo no mercado. Não existe em nenhuma parte do mundo nada igual”, explica Silva, hoje CEO da Reminds, em entrevista à TV Mundo do Marketing.
O desafio desta vez é criar uma espécie de rede social na qual as pessoas possam enviar para amigos e conhecidos recordações que têm com eles. Essas lembranças costumam surgir quando uma música é ouvida ou uma situação vivida e, na maioria das vezes, elas ficam apenas com quem sentiu, raramente são compartilhadas.
Pela plataforma, o usuário poderá enviar para o amigo a canção que o fez recordar de algo. O perfil, nesta nova rede social, será como um jardim de lembranças, que podem ser assistidas sempre que se tem vontade.
A Reminds já conquistou seu primeiro investimento e também está em fase de testes como MVP.
“Estamos usando uma forma inteligente de crescimento e de validação de mercado. A Reminds é gratuita para o usuário. O que precisamos é que o negócio ganhe tração, porque quando tiver uma audiência grande, haverá uma forma de monetizá-lo. Uma vantagem daqui do Vale do Silício é que os investidores não pensam que é preciso ter um faturamento alto para aplicar recursos e alavancar um negócio”, destaca Silva.
Desafios também existem
A região abriga o venture capital, os fornecedores, os parceiros e o olhar internacional, mas nem por isso oferece só vantagens para as startups. Os desafios para prosperar na região existem a começar pela concorrência - por capital, clientes e funcionários. O custo de vida e de operação é alto e vem se multiplicando para os brasileiros frente à escalada do dólar, já que muitos se mantêm com recursos oriundos das empresas já em funcionamento no Brasil, como é o caso da Worthix.
As despesas mensais para um negócio permanecer no Vale do Silício ficam entre US$ 5 mil e US$ 8 mil, valor que pode não ser compensado com receitas até o negócio ganhar tração. “O empreendedor nem sempre conta com esse budget para investir e, nesse caso, deve buscar outras cidades próximas daqui que ofereçam um custo menor.
Elas não vão gerar o mesmo número de oportunidades em um tempo tão curto, mas serão certamente mais produtivas do que qualquer cidade no Brasil. Há a possibilidade de ir para Nova York, Austin, Houston, Atlanta, locais que contam com programas de aceleração de startups mais baratos”, ressalta Cerqueira.
Outra forma mais econômica de aportar em San Francisco é buscar um empreendimento pequeno que esteja instalado na região e tentar conseguir um emprego nele. As startups da Califórnia têm a política de, à medida que o negócio cresça, distribuir pequenas participações para os funcionários que estão desde o princípio com elas.
Caso a empreitada dê certo e a empresa seja vendida, o profissional pode acabar milionário. Esse é um caminho mais curto também para se conseguir um visto de trabalho nos Estados Unidos.
Chegada por meio dos estudos
Um dos que adotou a estratégia foi o brasileiro Pedro Sorrentino, Ecosystem & Community Manager da SandGrid. Ele se mudou para os Estados Unidos há cerca de cinco anos, inicialmente para fazer um curso no Colorado.
Por lá, trabalhou como voluntário em empresas e eventos, em troca de ampliar seu network e conquistar espaço. No meio do caminho, montou uma startup, a Recomind.net, APP que acabou sendo vendido para o Buscapé.
Ao conseguir um emprego na SandGrid, uma plataforma de e-mails baseada na nuvem, o empreendedor teve que tomar a decisão por permanecer em San Francisco ou voltar para o Brasil e continuar na operação da Recomind.net, site usado para recomendação de prestadores de serviços, como diarista, eletricista, cabeleireira, pediatra, entre outros.
Sorrentino ainda ficou um mês trabalhando para os dois negócios, valendo-se da diferença no fuso, mas ficou claro que aquele era o momento para a tomada de decisão. “San Francisco nos oferece a oportunidade de trabalharmos com pessoas que são melhores do que nós e nos inspiram a ser melhores.
É muito aprendizado. Quando ingressei na empresa, éramos apenas 17 profissionais e hoje somos mais de 300. Temos clientes no mundo todo, como Ebay, Airbnb e Spotify”, conta Sorrentino, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Pitch na ponta da língua
O network no Vale do Silício acontece a todo momento e em todo lugar, desde o Starbucks até o elevador de um prédio comercial. Os empreendedores por lá levam sempre o pitch - apresentação de poucos minutos do negócio - na ponta da língua, porque nunca se sabe quando acontecerá o encontro com o presidente de uma agência de investimento.
Aproveitar esses momentos é muito importante, porque a indicação vale ouro na área de San Francisco.
As respostas dos interessados também são sinceras e verdadeiras, e as reuniões mais objetivas do que no Brasil. “O ecossistema é mais aberto a competências.
No Brasil, as pessoas precisam saber quem é você para confiar. Aqui, confiam até que se prove o contrário. Para ser bem sucedido, é um trabalho de formiguinha, de resiliência e muita determinação. Os melhores do mundo estão no Vale, que é como a liga espanhola do futebol”, resume Sorrentino, que também é Vice-Presidente da Associação Brasileira de Startups.
Para quem não pode ou não consegue partir de mala e cuia para a região, conhecer esse time e entender as regras do jogo já ajudam muito os negócios que desejam se tornar globais. A Apex promove expedições para San Francisco, onde já conta até com um escritório. Os empresários podem permanecer na cidade por algumas semanas e contar com a ajuda da agência para viabilizar visitas aos players do mercado e reuniões com pessoas influentes.
Conhecimento valioso
A iniciativa visa atender tanto aqueles que querem internacionalizar seu negócio, quanto os que estão atrás de melhores práticas e de troca de experiências.
“Mesmo as empresas que não buscam exportar produtos e serviços têm muito a aprender no Vale do Silício. Os conhecimentos adquiridos aqui podem tornar os negócios mais competitivos dentro do próprio país e os protegerão no mercado interno”, ressalta Silvia Pierson, Chefe de Operações Internacionais e COO da América do Norte da Apex, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Ainda assim, é importante só dar esse passo quando houver algo estruturado. “Vir apenas com uma ideia não é bom, porque o empreendedor aproveitará pouco. Em San Francisco, todos estão muito abertos ao novo, eles estão atrás de projetos diferentes, o que torna esse lugar tão especial que ninguém conseguiu replicá-lo ainda”, ressalta Silvia.
Assista ao hangout completo com Ariel Silva, CEO da Reminds e Guilherme Cerqueira, CEO da Worthix, entrevista à TV Mundo do Marketing.