"Mais maduros e engajados, brasileiros adquirem novos hábitos e aos poucos vão trocando a compra por impulso pela consciência socioambiental e até apostando no DIY."
*-$-$-* Por Roberta Moraes | 11/01/2016
Mais cautelosos, com o orçamento apertado e muito mais conscientes. Estas são apenas algumas particularidades que começam a ficar mais evidentes entre os brasileiros. Depois de uma década de prosperidade e estímulo ao consumo, a população se viu em meio à recessão econômica que tirou dela o poder de compra e limou do carrinho algumas categorias já alcançadas.
Os fatores que despertaram o mau humor também ajudaram a construir um novo posicionamento e contribuiu para que boa parte da população ficasse mais prudente com os gastos e preocupadas com o futuro.
Reconhecidamente criativo, o brasileiro passou a olhar para o DIY (faça você mesmo em inglês) como uma saída para economizar e até mesmo reduzir o descarte ao utilizar material reciclável. Mais exigente, o brasileiro agora quer saber quais são as políticas e propósitos das empresas, o que abre caminho para o mindful branding.
Mais do que nunca, as marcas devem ser mais claras em relação aos seus posicionamentos e ainda mostrar que suas práticas estão alinhadas ao discurso.
Apesar de parecer uma resposta ao momento econômico atual, estes hábitos devem se consolidar como um novo modelo de consumo para o futuro.
“O consumidor está mais maduro, mais consciente e esse comportamento veio para ficar. Ele está entendendo melhor qual é a vantagem da marca, além de um discurso raso aspiracional, e passou a compartilhar mais um conjunto de ações com as pessoas mais próximas”, comenta Renato Meirelles, presidente do Instituto Data Popular, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Veja cinco comportamentos dos brasileiros que devem ganhar ainda mais força neste ano a seguir.
1 – Alto nível de consciência
Sem ter dinheiro para gastar e com medo das incertezas do futuro, o consumidor brasileiro ficou mais preocupado com o que suas aquisições podem representar no mundo. Ao ter que controlar os desejos e abrir mão da compra pela compra, o shopper reflete mais sobre quais são as reais necessidades em adquirir um produto.
Além disso, a palavra desperdício saiu definitivamente do dicionário dele, o que impacta diretamente na escolha dos produtos nos supermercados. Apesar do apelo promocional das embalagens tamanho família, por exemplo, o consumidor pensará duas vezes antes de pegar um item que sobrará ou que não terá serventia, em uma clara rejeição à compra excessiva.
Este novo momento faz com que o brasileiro busque uma vida mais simples, mas sem perder algumas conquistas. “O consumidor não abre mão da comodidade, da conveniência, mas ele não quer criar um outro problema ao consumir exageradamente”, explica Eduardo França, Coordenador do MBA de Estratégias e Ciências do Consumo da ESPM-RJ, em entrevista ao Mundo do Marketing.
2 – Maior preocupação socioambiental
Ao adotar uma postura mais sustentável, o brasileiro entendeu que optar pelo comércio local é uma boa estratégia para ajudar a estimular a economia do seu entorno, garantindo a manutenção de postos de trabalhando e proporcionando maior receita para os entes governamentais. “Essa nova identidade comportamental não era observada no Brasil anteriormente, quando o importado era mais valorizado”, acrescentaFrança.
Esse engajamento é ainda mais profundo com preocupação sobre a procedência do produto, processos de fabricação e ainda qual o impacto ambiental que ele provocará ao meio ambiente após o uso. “A preocupação com o descarte já vinha apontando no mercado single e começa a chegar em outros públicos.
Por conta desse comportamento do consumidor, começamos a perceber uma reposta por parte da indústria, pois as pessoas querem saber o quanto as marcas ajudam nas suas rotinas e, principalmente, na qualidade de vida”, acrescenta França.
3 – Vida mais saudável
Não é de hoje que a saudabilidade entrou na rotina dos brasileiros, mas a tendência é que cada vez mais um maior número de consumidores abrace um estilo de vida mais saudável. Estimulados por influenciadores digitais que compartilham suas rotinas, a população passou a consumir mais itens ligados ao bem-estar, o que faz deste um dos segmentos que mais cresce no país, como mostrou a reportagem Saudabilidade: sem glúten, lactose e açúcar, mas com muito lucro.
O crescente número de pessoas diagnosticadas com intolerância a alguma substância também ajuda a movimentar o setor. Com a procura cada vez maior, a indústria tem se adequado a esta demanda aumentando a oferta de produtos diet, light, sem lactose e sem glúten.
Ao melhorar a qualidade da alimentação, o brasileiro fica ainda mais exigente com o que está colocando à mesa, o que também tem impulsionado o mercado de produtos orgânicos. Mesmo ainda com valores muito acima da média, o acesso está se democratizando em função da maior oferta.
4 – Compras pela internet
Estar mais racional e sustentável não quer dizer que o brasileiro deixará de consumir, mas ele passará a buscar canais cada vez mais apropriados e que se encaixem com a sua nova realidade. Como o quesito preço está pesando mais nas decisões, as lojas virtuais aparecem como uma saída para equacionar esta questão.
Com operação mais enxuta, o varejo online é mais competitivo e começa a se tornar um aliado neste momento de recessão. Justamente por conta dessa percepção, o e-commerce no Brasil foi um dos poucos setores que fechou com crescimento de dois dígitos em 2015. E a tendência é que este crescimento ainda continue nos próximos anos.
Não por acaso, em 2015, o fluxo de cliente no varejo físico teve redução de 6,8% se comparado a 2014, segundo a Virtual Gate. “A democratização do mercado vai fazendo com que mais pessoas alcancem novos patamares. E é isso que estamos observando com o e-commerce, que a cada ano atende a um número cada vez maior de novos consumidores virtuais”, reforça Eduardo França.
5 – Equilíbrio entre custo e benefício
Já que deixar de consumir é impossível, a saída é se adequar à nova realidade e buscar soluções inteligentes e econômicas, diminuindo as exigências. “O caso da SmartFit representa bem.
Com alta preocupação estética, o brasileiro quer malhar, mas entendeu que ele que não precisa de uma academia-clube, com mensalidades caras, para alcançar seus objetivos. Ele pode continuar fazendo atividade física sem estourar o orçamento. O sucesso é tão grande que a rede tem impactado, inclusive, os grandes players”, acrescenta França.
Outro mercado que também sentiu que o brasileiro está mais racional é de telecomunicações. Com a consolidação dos aplicativos de mensagens e facilidade de comunicação por meio da internet, o pacote de voz foi ficando obsoleto.
Ainda impulsionado pela web, as plataformas que estimulam o consumo compartilhado, como AirBnb e Uber, estão virando aliados de quem quer economizar, assim como a troca de produtos e mercadorias, que está voltando a ser uma prática habitual.
Isso sem contar nas empresas que fazem permuta, onde os indivíduos também entenderam que o escambo pode ser uma boa saída para acessar o que se deseja sem colocar a mão no bolso. Uma saída bem antiga, mas que volta a fazer sentido nos dias de hoje.