"Ainda envoltas em tabus e preconceitos, sex shops se reposicionam como boutiques e miram nas mulheres, que hoje já representam 70% do público. Marcas investem até em ações sociais."
Luz neon, ambiente escuro e filmes pornográficos expostos nas estantes. Esses eram alguns dos elementos mais característicos das sex shops dos anos 1980 e 1990, mas que, hoje, estão cada vez mais distantes da realidade do setor erótico e sensual brasileiro.
Dão lugar a eles, paredes brancas, comunicação visual clean e a preocupação em evitar que produtos mais explícitos permaneçam à vista e assustem a clientela. A mudança faz parte dos esforços dos empresários para levar casais e, especialmente, mulheres casadas para dentro de lojas e ao e-commerce, pessoas que até bem pouco tempo atrás não se enxergavam como clientes dessas empresas.
O público feminino já representa 70% dos compradores de sex shops físicas e virtuais, cujas vendas cresceram 20% em 2002, 15% em 2006, 18,5% em 2011 e 8% em 2013. Neste último ano, o incremento no faturamento ficou abaixo do que nos demais períodos, devido à ameaça de crise econômica, mas, ainda assim, acima do resultado de outros setores da economia.
Mesmo com o longo período de crescimento contínuo, segundo pesquisa da fabricante de preservativos e itens eróticos Durex, apenas 17% dos brasileiros já adquiriram ou experimentaram um produto do setor, ante 22% das pessoas, quando se considera todo o mundo.
A última estratégia das empresas que atuam neste mercado, intensificada este ano, foi o investimento em ações de responsabilidade social. “Em outubro, vestimos as sex shops da Avenida Paulista, em São Paulo, de rosa, numa campanha pelo combate ao câncer de mama, e distribuímos dois mil informativos sobre a prevenção à doença.
Também entregamos géis massageadores às mulheres, e o sorriso que vimos no rosto delas nos mostrou que já estão compreendendo a função de nossos produtos”, comemora Paula Aguiar, presidente da Associação Brasileira das Empresas do Mercado Erótico e Sensual (Abeme), em entrevista ao Mundo do Marketing.
Retorno às raízes
Esse movimento de aproximação do público feminino representa um retorno às origens, já que a primeira sex shop foi inaugurada na Alemanha pós-Segunda Guerra Mundial, por uma mulher que enxergava na atividade uma ferramenta de empoderamento das demais mulheres.
A maioria delas não havia recebido uma educação sexual voltada para o prazer e a saúde, lacuna percebida por Beate Uhse, que havia sido privilegiada por uma educação não repressora conduzida por pais médicos.
Após começar vendendo tabelinhas porta a porta, a ex-pilota de acrobacia aérea, então desempregada, ampliou seu portfólio e se tornou conselheira das moradoras do entorno.
Quando o modelo foi importado para os Estados Unidos, no início da década de 1970, entretanto, ganhou novos contornos.
Os filmes pornográficos foram colocados à venda dentro dessas lojas, modificando o público que frequentava o ponto de venda. Os homens heterossexuais e, especialmente, os homoafetivos passaram a ser o principal público. “Estamos na terceira geração de empresários à frente do setor, que marca o retorno das mulheres para a condução dos empreendimentos.
Essa mudança deu uma guinada nos negócios, que hoje buscam desconstruir os tabus e os preconceitos que estão entranhados na cultura brasileira”, relata Paula, que atua no setor há quase 15 anos.
A empresária começou sua trajetória na internet e pode ser considerada veterana, já que, entre os negócios online, 56% foram inaugurados há menos de dois anos e 76%, há menos de três anos. Entre os empresários do setor, 100% contam com lojas virtuais, 33% físicas e 29% atuam por meio de catálogos, segundo levantamento da Abeme.
Além das ações sociais realizadas ao longo de 2014, a associação também aposta no público evangélico para incrementar o faturamento. Até o fim deste mês, a instituição lançará um e-book com instruções para a venda a essa parcela da população.
Venda para crentes
Entre os temas abordados nos capítulos estão “Deus e o sexo”, “a bíblia e o sexo” e “como atender a esse público”. Alguns pastores já apontam os produtos eróticos e sensuais como importantes ferramentas para a manutenção de casamentos, mas ainda existem muitas fiéis que vendem os itens às amigas de cultos de forma quase clandestina, temendo represálias da Igreja.
Nas lojas, no entanto, as crentes se mostram mais abertas a informações e ofertas do que as católicas, que continuam mais envoltas em tabus.
Com a crescente demanda por informações sobre como vender para pessoas religiosas, a associação reuniu empresários do setor, clientes evangélicas e especialistas em educação sexual para desenvolverem o e-book.
“O intuito é quebrar tabus, mostrar que o produto erótico tem o poder de unir, reconectar casais, inclusive aqueles que estão juntos dentro da fé. Os itens são importantes aliados das famílias”, ressalta Paula.
Essa necessidade de educação estimula a venda direta como um importante canal de compra de produtos do setor.
A aquisição de itens costuma vir acompanhada de aconselhamentos e explicações de uso. Nesse contexto, nasceu a Sophie Boutique Sensual, há cerca de um ano e meio. A marca atua por meio do sistema de festas, encontros e reuniões realizados pelas consultoras, num modelo semelhante ao adotado inicialmente pela Tupperware.
A ideia é que as mulheres se encontrem dentro de seu círculo de amizade, num ambiente em que se sentem seguras para conversar sobre suas intimidades.
Marca busca investidores para expandir
Atualmente, a empresa conta com 10 consultoras e busca investidores para poder ganhar capilaridade. “Eu e minha sócia fizemos 60 reuniões no primeiro ano para validar esse modelo. Passaram por nós mais de mil mulheres.
Nosso objetivo não é apenas vender um produto, mas transformar a consciência delas sobre a sexualidade humana. Por isso, sempre levamos um conteúdo para ajudá-las a construir esse relacionamento com seu próprio corpo”, diz Christiane Marcello, Fundadora da Sophie Boutique Sensual, em entrevista ao Mundo do Marketing.
A marca busca se distanciar ao máximo do conceito de sex shop, por este mercado ainda estar marginalizado, ancorado na pornografia, no chulo e no vulgar. Para se afastar dos atributos negativos e pejorativos, a companhia optou por se posicionar como boutique, assim como muitas empresas que atuam no setor.
As atividades não se resumem às reuniões. Hoje, a Sophie Boutique Sensual conta com mais dois núcleos: um que vende serviços complementares, como palestras e rodas de leitura, e outro com foco na fabricação de produtos, como bijuterias para o corpo, acessórios, luvas e vendas.
O trabalho todo tem na educação um importante pilar. “Cerca de 99% das mulheres que chegam às reuniões nunca estiveram numa sex shop. Elas costumam manifestar o desejo de apimentar a relação. À medida que a mulher chega no núcleo de aconselhamento, acaba trazendo seus maridos.
Aos poucos, estamos formando nossos primeiros grupos de homens”, conta Christiane, que ganhou experiência durante os cerca de 15 anos em que atuou como Executiva de empresas como Avon, Grupo Boticário e Jequiti.
Comunicação voltada para o romantismo
A maioria das novas companhias do setor já nasceu adotando a comunicação voltada para o amor e para os casais. Essa voz coesa vem gerando efeitos positivos na imagem do mercado perante a sociedade, embora a relação com o vulgar ainda seja comum na mente de muitos consumidores.
A comunicação visual das lojas é muito importante para a mudança na concepção do público, e essa é uma das apostas da Doce Sensualidade. A boutique foca no romantismo e no amor em todas as peças no ponto de venda e no site.
A própria distribuição dos produtos na loja apresenta os clientes aos produtos de forma amena. A proposta é conquistar a confiança do consumidor pouco a pouco, até partir para entender as reais necessidades dele. A ideia é trabalhar como num relacionamento, começando pela sedução.
A pessoa chega no ambiente claro, intimista, onde não há vibradores e próteses expostas. Os produtos são apresentados pouco a pouco, para que o cliente vá se despindo de inibições e preconceitos.
O mesmo conceito está sendo aplicado ao e-commerce que será lançado nos próximos dias. “O tabu é um dos fatores que mais distanciam o público-alvo de uma loja, e isso impõe alguns cuidados. Quando abri o ponto de venda, desenvolvi embalagens lindas e sacolas com o logotipo da empresa, mas os clientes não queriam usá-las, porque tinham vergonha.
Hoje usamos bolsas pretas, sem nenhuma referência. Somos conhecidos como o país das mulheres mais sensuais, da bunda, do carnaval, mas quando montamos a empresa é que vimos como, na verdade, somos retrógrados em relação a sexualidade”, analisa Thais Plaza, Sócia da Doce Sensualidade, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Dão lugar a eles, paredes brancas, comunicação visual clean e a preocupação em evitar que produtos mais explícitos permaneçam à vista e assustem a clientela. A mudança faz parte dos esforços dos empresários para levar casais e, especialmente, mulheres casadas para dentro de lojas e ao e-commerce, pessoas que até bem pouco tempo atrás não se enxergavam como clientes dessas empresas.
O público feminino já representa 70% dos compradores de sex shops físicas e virtuais, cujas vendas cresceram 20% em 2002, 15% em 2006, 18,5% em 2011 e 8% em 2013. Neste último ano, o incremento no faturamento ficou abaixo do que nos demais períodos, devido à ameaça de crise econômica, mas, ainda assim, acima do resultado de outros setores da economia.
Mesmo com o longo período de crescimento contínuo, segundo pesquisa da fabricante de preservativos e itens eróticos Durex, apenas 17% dos brasileiros já adquiriram ou experimentaram um produto do setor, ante 22% das pessoas, quando se considera todo o mundo.
A última estratégia das empresas que atuam neste mercado, intensificada este ano, foi o investimento em ações de responsabilidade social. “Em outubro, vestimos as sex shops da Avenida Paulista, em São Paulo, de rosa, numa campanha pelo combate ao câncer de mama, e distribuímos dois mil informativos sobre a prevenção à doença.
Também entregamos géis massageadores às mulheres, e o sorriso que vimos no rosto delas nos mostrou que já estão compreendendo a função de nossos produtos”, comemora Paula Aguiar, presidente da Associação Brasileira das Empresas do Mercado Erótico e Sensual (Abeme), em entrevista ao Mundo do Marketing.
Retorno às raízes
Esse movimento de aproximação do público feminino representa um retorno às origens, já que a primeira sex shop foi inaugurada na Alemanha pós-Segunda Guerra Mundial, por uma mulher que enxergava na atividade uma ferramenta de empoderamento das demais mulheres.
A maioria delas não havia recebido uma educação sexual voltada para o prazer e a saúde, lacuna percebida por Beate Uhse, que havia sido privilegiada por uma educação não repressora conduzida por pais médicos.
Após começar vendendo tabelinhas porta a porta, a ex-pilota de acrobacia aérea, então desempregada, ampliou seu portfólio e se tornou conselheira das moradoras do entorno.
Quando o modelo foi importado para os Estados Unidos, no início da década de 1970, entretanto, ganhou novos contornos.
Os filmes pornográficos foram colocados à venda dentro dessas lojas, modificando o público que frequentava o ponto de venda. Os homens heterossexuais e, especialmente, os homoafetivos passaram a ser o principal público. “Estamos na terceira geração de empresários à frente do setor, que marca o retorno das mulheres para a condução dos empreendimentos.
Essa mudança deu uma guinada nos negócios, que hoje buscam desconstruir os tabus e os preconceitos que estão entranhados na cultura brasileira”, relata Paula, que atua no setor há quase 15 anos.
A empresária começou sua trajetória na internet e pode ser considerada veterana, já que, entre os negócios online, 56% foram inaugurados há menos de dois anos e 76%, há menos de três anos. Entre os empresários do setor, 100% contam com lojas virtuais, 33% físicas e 29% atuam por meio de catálogos, segundo levantamento da Abeme.
Além das ações sociais realizadas ao longo de 2014, a associação também aposta no público evangélico para incrementar o faturamento. Até o fim deste mês, a instituição lançará um e-book com instruções para a venda a essa parcela da população.
Venda para crentes
Entre os temas abordados nos capítulos estão “Deus e o sexo”, “a bíblia e o sexo” e “como atender a esse público”. Alguns pastores já apontam os produtos eróticos e sensuais como importantes ferramentas para a manutenção de casamentos, mas ainda existem muitas fiéis que vendem os itens às amigas de cultos de forma quase clandestina, temendo represálias da Igreja.
Nas lojas, no entanto, as crentes se mostram mais abertas a informações e ofertas do que as católicas, que continuam mais envoltas em tabus.
Com a crescente demanda por informações sobre como vender para pessoas religiosas, a associação reuniu empresários do setor, clientes evangélicas e especialistas em educação sexual para desenvolverem o e-book.
“O intuito é quebrar tabus, mostrar que o produto erótico tem o poder de unir, reconectar casais, inclusive aqueles que estão juntos dentro da fé. Os itens são importantes aliados das famílias”, ressalta Paula.
Essa necessidade de educação estimula a venda direta como um importante canal de compra de produtos do setor.
A aquisição de itens costuma vir acompanhada de aconselhamentos e explicações de uso. Nesse contexto, nasceu a Sophie Boutique Sensual, há cerca de um ano e meio. A marca atua por meio do sistema de festas, encontros e reuniões realizados pelas consultoras, num modelo semelhante ao adotado inicialmente pela Tupperware.
A ideia é que as mulheres se encontrem dentro de seu círculo de amizade, num ambiente em que se sentem seguras para conversar sobre suas intimidades.
Marca busca investidores para expandir
Atualmente, a empresa conta com 10 consultoras e busca investidores para poder ganhar capilaridade. “Eu e minha sócia fizemos 60 reuniões no primeiro ano para validar esse modelo. Passaram por nós mais de mil mulheres.
Nosso objetivo não é apenas vender um produto, mas transformar a consciência delas sobre a sexualidade humana. Por isso, sempre levamos um conteúdo para ajudá-las a construir esse relacionamento com seu próprio corpo”, diz Christiane Marcello, Fundadora da Sophie Boutique Sensual, em entrevista ao Mundo do Marketing.
A marca busca se distanciar ao máximo do conceito de sex shop, por este mercado ainda estar marginalizado, ancorado na pornografia, no chulo e no vulgar. Para se afastar dos atributos negativos e pejorativos, a companhia optou por se posicionar como boutique, assim como muitas empresas que atuam no setor.
As atividades não se resumem às reuniões. Hoje, a Sophie Boutique Sensual conta com mais dois núcleos: um que vende serviços complementares, como palestras e rodas de leitura, e outro com foco na fabricação de produtos, como bijuterias para o corpo, acessórios, luvas e vendas.
O trabalho todo tem na educação um importante pilar. “Cerca de 99% das mulheres que chegam às reuniões nunca estiveram numa sex shop. Elas costumam manifestar o desejo de apimentar a relação. À medida que a mulher chega no núcleo de aconselhamento, acaba trazendo seus maridos.
Aos poucos, estamos formando nossos primeiros grupos de homens”, conta Christiane, que ganhou experiência durante os cerca de 15 anos em que atuou como Executiva de empresas como Avon, Grupo Boticário e Jequiti.
Comunicação voltada para o romantismo
A maioria das novas companhias do setor já nasceu adotando a comunicação voltada para o amor e para os casais. Essa voz coesa vem gerando efeitos positivos na imagem do mercado perante a sociedade, embora a relação com o vulgar ainda seja comum na mente de muitos consumidores.
A comunicação visual das lojas é muito importante para a mudança na concepção do público, e essa é uma das apostas da Doce Sensualidade. A boutique foca no romantismo e no amor em todas as peças no ponto de venda e no site.
A própria distribuição dos produtos na loja apresenta os clientes aos produtos de forma amena. A proposta é conquistar a confiança do consumidor pouco a pouco, até partir para entender as reais necessidades dele. A ideia é trabalhar como num relacionamento, começando pela sedução.
A pessoa chega no ambiente claro, intimista, onde não há vibradores e próteses expostas. Os produtos são apresentados pouco a pouco, para que o cliente vá se despindo de inibições e preconceitos.
O mesmo conceito está sendo aplicado ao e-commerce que será lançado nos próximos dias. “O tabu é um dos fatores que mais distanciam o público-alvo de uma loja, e isso impõe alguns cuidados. Quando abri o ponto de venda, desenvolvi embalagens lindas e sacolas com o logotipo da empresa, mas os clientes não queriam usá-las, porque tinham vergonha.
Hoje usamos bolsas pretas, sem nenhuma referência. Somos conhecidos como o país das mulheres mais sensuais, da bunda, do carnaval, mas quando montamos a empresa é que vimos como, na verdade, somos retrógrados em relação a sexualidade”, analisa Thais Plaza, Sócia da Doce Sensualidade, em entrevista ao Mundo do Marketing.