Em vez de rolar a tela em aplicativos como TikTok e Instagram o dia inteiro, ela usa o chamado "telefone burro".
São aparelhos celulares básicos, telefones comuns, com funções muito limitadas em comparação, por exemplo, com um iPhone.
Tipicamente, você pode apenas fazer e receber ligações e trocar
mensagens de texto por SMS. E, se você tiver sorte, poderá ouvir rádio e
tirar fotos muito simples, mas certamente não se conectará à internet,
nem terá aplicativos.
Esses aparelhos são similares a alguns dos primeiros telefones celulares que as pessoas compravam no final da década de 1990.
A decisão de West de abandonar seu smartphone dois anos atrás foi
tomada de impulso. Ela estava procurando um aparelho substituto em uma
loja de telefones usados quando foi atraída pelo baixo preço de um
telefone do tamanho de um tijolo.
Estes telefones são de 2005 - dois anos antes do lançamento do primeiro
iPhone da Apple e 11 anos antes de surgir o TikTok — Foto: Getty Images
via BBC Seu aparelho atual é da empresa francesa MobiWire e custou apenas 8 libras (R$ 51).
E, como ele não tem as funcionalidades dos smartphones, ela não precisa
se preocupar com contas mensais de acesso à internet com alto valor.
"Só
quando comprei um telefone 'burro' é que percebi o quanto o smartphone
estava ocupando a minha vida", ela conta. "Eu tinha muitos aplicativos
de redes sociais e não conseguia fazer minhas tarefas porque estava
sempre ao telefone."
West, que mora em Londres, não acredita que vá comprar outro smartphone
algum dia. "Estou satisfeita com meu tijolo — não acho que ele imponha
limitações. Certamente estou mais proativa."
Robin West conta que seus amigos continuam perguntando quando ela irá comprar um novo smartphone — Foto: Robin West via BBC
Os telefones "burros" estão ressurgindo. As buscas por eles no Google
saltaram em 89% entre 2018 e 2021, segundo um relatório da empresa de
software norte-americana Semrush.
Os números de vendas são difíceis de encontrar, mas um relatório afirma que as vendas globais de telefones "burros" estavam a ponto de atingir um bilhão de unidades no ano passado, em comparação com 400 milhões em 2019. Paralelamente, foram vendidos em todo o mundo 1,4 bilhão de smartphones em 2021, após uma redução de 12,5% em 2020.
Além disso, um estudo feito em 2021 pelo grupo contábil Deloitte
concluiu que um em cada 10 usuários de telefones celulares no Reino
Unido tem um telefone "burro".
"Parece que a moda, a nostalgia e o fato deles aparecerem em vídeos no
TikTok colaboram no ressurgimento dos telefones 'burros'", segundo
Ernest Doku, especialista em telefones celulares do site de comparação
de preços Unswitch.com. "Muitos de nós tivemos um telefone 'burro' como
nosso primeiro celular e é natural sentirmos um pouco de nostalgia com
relação a esses aparelhos clássicos."
Doku afirma que o relançamento do modelo 3310 da Nokia em 2017
— lançado pela primeira vez em 2000 e um dos telefones celulares mais
vendidos de todos os tempos — realmente incentivou esse renascimento.
Para ele, "a Nokia ofereceu o 3310 como uma alternativa acessível em um
mundo cheio de telefones celulares muito avançados".
Ele reconhece que os telefones "burros" não podem competir com os
últimos modelos da Apple e da Samsung em termos de desempenho ou
funcionalidade, "mas eles podem superá-los em questões igualmente
importantes, como o consumo de bateria e a durabilidade".
Cinco anos atrás, o psicólogo Przemek Olejniczak trocou seu smartphone
por um Nokia 3310, inicialmente devido ao seu menor consumo de bateria.
Mas ele logo percebeu que havia outros benefícios.
Przemek Olejniczak admite que agora ele se planeja melhor antes de viajar — Foto: Przemek Olejniczak via BBC
"Antes, eu ficava sempre preso ao telefone, verificando tudo e qualquer
coisa, navegando pelo Facebook, pelas notícias ou por outros fatos que
eu não precisava saber", ele conta. "Agora, tenho mais tempo para mim e
para minha família. Um enorme benefício é que não sou viciado em curtir,
compartilhar, comentar ou descrever minha vida para outras pessoas.
Agora, tenho mais privacidade."
Mas Olejniczak, que vive em Lodz, na Polônia, admite que, inicialmente,
a mudança foi um desafio. "Antes, eu verificava tudo, como ônibus e
restaurantes, no meu smartphone [durante a viagem]. Agora que não é mais
possível, aprendi a fazer tudo isso com antecedência em casa. E me
acostumei com isso."
'Espécie superior que controla os humanos'
A companhia Light Phone, de Nova York, nos Estados Unidos, é um
fabricante de telefones "burros". Um pouco mais inteligentes que o
padrão para esses produtos, seus aparelhos permitem que os usuários
ouçam música e podcasts e os conectem aos seus fones de ouvido
Bluetooth.
Mas a empresa afirma que seus telefones "nunca terão redes sociais,
notícias para atrair cliques, e-mail, navegadores da internet, nem
outros feeds infinitos para induzir a ansiedade".
A Light Phone afirma que a venda dos seus aparelhos, como o da foto, disparou — Foto: Light Phone via BBC
A companhia afirma que registrou em 2021 seu melhor desempenho
financeiro em um ano, com aumento das vendas de 150% em comparação com
2020. Isso, apesar do alto custo dos seus aparelhos, em termos de
telefones "burros". Seus preços começam em US$ 99 (R$ 478).
Um dos fundadores da Light Phone, Kaiwei Tang, afirma que o aparelho
foi criado inicialmente para uso como telefone secundário - para pessoas
que quisessem desligar-se do seu smartphone no fim de semana, por
exemplo. Mas, agora, a metade dos clientes da empresa usa o aparelho
como telefone principal.
Kaiwei Tang, um dos fundadores da Light Phone, brinca que muitas
pessoas são controladas pelos seus smartphones — Foto: Kaiwei Tang via
BBC
"Se
extraterrestres viessem para a Terra, eles pensariam que os telefones
celulares são a espécie superior que controla os seres humanos", afirma
ele. "E isso não irá parar, só irá ficar pior. Os consumidores estão
percebendo que algo está errado e queremos oferecer uma alternativa."
Tang acrescenta que, surpreendentemente, os principais clientes da empresa têm idade entre 25 e 35 anos. Ele esperava que seus clientes seriam muito mais velhos.
Para a especialista em tecnologia Sandra Wachter, pesquisadora sênior
na área de inteligência artificial da Universidade de Oxford, no Reino
Unido, é compreensível que algumas pessoas estejam procurando telefones
celulares mais simples.
"Pode-se afirmar de forma razoável que, atualmente, a capacidade de um
smartphone de completar chamadas e enviar mensagens curtas é quase uma
função secundária", explica ela. "O smartphone é o seu centro de
entretenimento, gerador de notícias, sistema de navegação, agenda,
dicionário e carteira."
Ela acrescenta que os smartphones sempre "querem chamar nossa atenção"
com notificações, atualizações e notícias de última hora interrompendo
constantemente o seu dia. "Isso pode manter você apreensivo e até
agitado. Você pode se sentir sobrecarregado."
Sandra Wachter afirma que é compreensível que algumas pessoas se sintam
"sobrecarregadas" pelos seus smartphones — Foto: Sandra Wachter via BBC
Wachter acrescenta: "faz sentido que algumas pessoas estejam agora
procurando tecnologias mais simples e acreditem que os telefones
'burros' podem representar um retorno a tempos mais simples. Eles
poderão oferecer mais tempo para que as pessoas se concentrem em uma
única tarefa e se dediquem a ela mais objetivamente. Eles poderão até
acalmar as pessoas. Estudos demonstraram que a quantidade excessiva de
escolhas pode criar infelicidade e agitação."
De volta a Londres, Robin West afirma que muitas pessoas ainda estão
perplexas com sua escolha de aparelho celular. "Todos acham que é algo
temporário. Eles perguntam: 'então, quando você vai comprar um
smartphone? Você vai comprar um esta semana?'"
Com reportagem adicional de Will Smale, editor da série New Tech Economy, da BBC News.
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