Sanjay Khosla e Mohanbir Sawhney citam exemplos como Kraft Foods, Unilever e Fonterra Brands
* Por Sanjay Khosla e Mohanbir Sawhney
Muitos líderes empresariais continuam a buscar o crescimento por meio da ampliação das linhas de produtos e marcas já existentes, além de tentar explorar novas regiões geográficas. Afinal, o crescimento é sempre visto como “mais”: mais produtos nas prateleiras, mais categorias, mais marcas e mais mercados. No entanto, essa abordagem é exatamente o oposto do que os executivos deveriam fazer para aumentar o faturamento e o lucro. A tradicional estratégia de “crescer com mais” dissipa os esforços da organização, além de aumentar a complexidade da empresa e de suas operações.
A melhor receita para o crescimento, independentemente do ambiente econômico, é “crescer com menos”, o que significa, mais precisamente, “crescer com foco”. Essa conclusão é baseada em nossa experiência em três empresas bem conhecidas – Kraft Foods, Unilever e Fonterra Brands (fabricante de derivados de leite com sede na Nova Zelândia) – em três continentes nos últimos dez anos. Nesses três casos, uma estratégia deliberada de foco em alguns poucos mercados, marcas e categorias gerou um aumento impressionante do faturamento e do lucro.
Crescer com foco não é simplesmente escolher que apostas estratégicas fazer. Requer que a liderança da empresa siga uma abordagem sistemática que se baseia em três idéias-chave: estratégia com foco, comunicação com simplicidade e execução com empowerment. Para isso, é preciso cumprir um conjunto de sete passos, detalhados a seguir.
1 - Descoberta: encontre o que funciona
Todas as grandes empresas apresentam bolsões de excelente desempenho, que ajudam a identificar áreas prioritárias de crescimento. Um modo eficiente de descobri-los é realizar uma série de workshops com os líderes top da empresa.
Na unidade da Lipton (de bebidas) da Unilever, o processo começou no Colworth House, o centro de pesquisa e desenvolvimento da empresa no Reino Unido. Os cem principais líderes da área de bebidas da Unilever em todo o mundo foram convidados para um workshop em 2000 a fim de definir o que funcionava bem em mercados específicos e expandir as experiências de sucesso para outras regiões geográficas. Um ano depois, esse evento foi seguido por outro workshop, em Bruxelas, Bélgica, para discutir como alcançar um faturamento de US$ 10 bilhões em dez anos nesses mercados e para imaginar o futuro da Lipton em relação a concorrentes da Unilever.
2 - Estratégia: use lentes especiais
O processo de descoberta produz um conjunto de tópicos de sucesso. No segundo momento do processo sugerido por nós, esses tópicos precisam ser agrupados por afinidade e priorizados, a fim de que se definam as apostas da empresa.
A Fonterra Brands usou, em seu processo de descoberta, duas lentes especiais para esse agrupamento: uma plataforma de produtos e um canal de distribuição. Com a primeira lente, identificou a osteoporose como plataforma-chave na qual apostar, com base em seu expertise com produtos que fazem bem para os ossos. Então, para buscar a liderança aí, fez uma parceria com a Luna, unidade de saúde da GE, com tecnologia de densitometria óssea. A primeira iniciativa da parceria foi um programa com o nome Anlene (a marca dos produtos Fonterra que fazem bem para os ossos), que oferecia exames gratuitos de densitometria óssea em nove países da Ásia.
Usando a segunda lente, a Fonterra apostou no canal de distribuição dos serviços de alimentação como caminho para seu crescimento futuro. O resultado foi um negócio específico chamado Fonterra Foodservices, que oferece um conjunto completo de derivados de leite e soluções sob medida para profissionais do setor. O foco através da lente do canal de distribuição levou à estratégia de criação desse negócio único e integrado, do tipo “da vaca para o consumidor”.
3 - Visão: encontre um “gancho”
Após definir as áreas que focar, as conclusões devem ser resumidas em uma visão veemente e simples. A visão precisa equivaler a um chamado para que a organização alinhe esforços em torno de um objetivo claramente compreendido.
Na Fonterra, as visões-slogans eram “Winning through brands” (vencendo pelas marcas) e “Dairy for life” (na tradução livre, leite para a vida). Incluíam-se aí dois temas: o orgulho de ser fazendeiro –a Fonterra é uma cooperativa de agropecuaristas – e a ênfase da empresa em produtos naturais, representados pelas cores azul e verde do logo da empresa. Na Lipton, a visão foi “Painting the world yellow” (pintando o mundo de amarelo). A cor característica da marca representava o brilho da luz do sol e remetia a uma experiência mais ampla do que uma simples xícara de chá. Vale lembrar que a visão precisa ser lançada com certo estardalhaço.
4 - Pessoas: libere o potencial
O próximo passo é encontrar as pessoas certas e colocar nas mãos delas recursos desproporcionais. Diga-se que as pessoas certas são para todas as áreas da empresa –cadeia de fornecimento, P&D, marketing e vendas–, a fim de assegurar que se conte com as habilidades necessárias para vencer.
Na Kraft, mudanças significativas foram feitas no topo da hierarquia. Menos de dois anos depois de lançar a iniciativa de transformação organizacional, dois terços dos 30 principais líderes eram novos em seus cargos. Muitos deles eram de dentro da própria Kraft. Alguns foram recrutados no mercado e outros foram trazidos com a aquisição bem-sucedida da unidade de biscoitos do grupo Danone, em novembro de 2007. De forma semelhante, alguns gestores foram recrutados de empresas líderes no setor de bebidas (Coca-Cola, Pepsi, Schweppes), para alavancar a capacidade da Unilever de atuar no setor de alimentos.
Nas grandes empresas, o orçamento é um grande inimigo da criatividade. Os líderes se sentem automaticamente cerceados por restrições orçamentárias, reais ou percebidas, e “calam” sua imaginação. Para libertá-los disso, recomendamos uma abordagem contraintuitiva: dar às pessoas grandes objetivos (lucros, não apenas aumento de vendas) e –também– poder de fogo para alcançá-los, o que significa recursos virtualmente ilimitados. Embora isso pareça incentivar o desperdício, a meta de lucro induz o gasto “sábio”.
5 - Execução: esclareça e delegue
Aqui há dois elementos-chave:
• É preciso ser claro sobre quem vai fazer o quê, para evitar a ambiguidade sobre os papéis e as responsabilidades.
• O processo de tomada de decisão deve se aproximar dos clientes e consumidores – não do CEO.
Na Kraft, a responsabilidade pelas coisas estava fragmentada pelas várias áreas funcionais, mercados e unidades de negócios, mas o processo de tomada de decisão era altamente centralizado. Decisões como precificação do café na Alemanha eram tomadas na sede da empresa, por exemplo. Então, deu-se aos líderes dos negócios locais liberdade para tomar decisões ali. Para acelerar a execução, sugerimos:
• Demandar uma redução significativa no número de documentos e reuniões internas, que, quando excessivos, estimulam a paralisia da análise, promovem o foco voltado para dentro em detrimento do externo e enfatizam o passado, não o futuro.
• Adotar uma política de eliminação do PowerPoint nas apresentações; as reuniões geralmente se tornam mais produtivas se concentradas em discussões baseadas em leituras prévias.
6 - Organização: crie redes colaborativas
Iniciativas de crescimento raramente combinam com feudos organizacionais, seja por área funcional, região geográfica ou unidade de negócios. Precisam ser geridas por comunidades e redes que perpassem toda a companhia e sejam igualmente formais e informais.
Os biscoitos Oreo são bom exemplo disso. Eram uma marca forte nos Estados Unidos, mas tinham um perfil fraco no restante do mundo. Uma das razões era o pressuposto de que o que era bom para a Oreo nos Estados Unidos era bom para a China, para o Reino Unido ou para outros países. A empresa aprendeu que isso não era verdade. Para fazer a marca crescer na China, os biscoitos passaram a ser menos doces para agradar ao paladar local. A Kraft começou a dar mais atenção às promoções locais e a atividades específicas do mercado chinês.
Essas e outras decisões semelhantes foram possíveis porque a Kraft criou equipes de atuação global por categoria de produto. Tais equipes eram formadas por executivos de diferentes áreas e regiões do mundo e tinham por missão gerir marcas globais, inovação e cadeias de fornecimento abrangendo diferentes mercados.
7 - Métricas: reúna os números e conte histórias
Ao monitorar, devem-se escolher métricas simples, objetivas, que destaquem as prioridades de execução.
Na Kraft, a presidente Irene Rosenfeld pediu que as unidades de negócios criassem um scorecard de uma página que incluísse três parâmetros-chave: vendas, lucros e fluxo de caixa. Essas três medidas serviam de base para o pagamento de bônus para todos os funcionários. Isso reduziu bastante a complexidade dos relatórios e criou uma cultura clara de responsabilização pelos resultados.
A gestão do crescimento requer o foco nos números, mas eles sozinhos não bastam. Um esforço consciente deve ser feito para registrar por escrito e disseminar histórias de sucesso por trás dos números.
Como evitar armadilhas
Uma armadilha comum nesse processo é buscar ganhar escala antes de resolver problemas subjacentes. Por exemplo, é fácil se deixar seduzir pelo tamanho total de um mercado e esquecer a complexidade da distribuição ali. Outra armadilha potencial é negligenciar, ou gerenciar mal, as partes do negócio que não se encaixam nas áreas de foco central, a “cauda” do negócio: produtos, marcas, categorias e mercados que não fazem parte da lista de prioridades.
Além disso, manter um tom positivo é vital para o sucesso do crescimento com foco. Uma espiral negativa pode destruir o moral e fazer desandar a mudança. O sol gera uma quantidade enorme de energia, mas nos manda apenas uma leve sensação de todo esse calor. Um feixe de laser, por sua vez, com alguns quilowatts de energia, é capaz de cortar o metal. Esse é o poder do foco.
*Sanjay Khosla comanda a área de mercados em desenvolvimento e categorias globais da Kraft Foods. Mohanbir Sawhney é diretor do centro de pesquisa em tecnologia e inovação da Kellogg School of Management.
**Esta reportagem foi publicada pela Revista HSM Management e agora no Mundo do Marketing por meio de parceria que os dois veículos mantêm.
1 - Descoberta: encontre o que funciona
Na unidade da Lipton (de bebidas) da Unilever, o processo começou no Colworth House, o centro de pesquisa e desenvolvimento da empresa no Reino Unido. Os cem principais líderes da área de bebidas da Unilever em todo o mundo foram convidados para um workshop em 2000 a fim de definir o que funcionava bem em mercados específicos e expandir as experiências de sucesso para outras regiões geográficas. Um ano depois, esse evento foi seguido por outro workshop, em Bruxelas, Bélgica, para discutir como alcançar um faturamento de US$ 10 bilhões em dez anos nesses mercados e para imaginar o futuro da Lipton em relação a concorrentes da Unilever.
2 - Estratégia: use lentes especiais
O processo de descoberta produz um conjunto de tópicos de sucesso. No segundo momento do processo sugerido por nós, esses tópicos precisam ser agrupados por afinidade e priorizados, a fim de que se definam as apostas da empresa.
A Fonterra Brands usou, em seu processo de descoberta, duas lentes especiais para esse agrupamento: uma plataforma de produtos e um canal de distribuição. Com a primeira lente, identificou a osteoporose como plataforma-chave na qual apostar, com base em seu expertise com produtos que fazem bem para os ossos. Então, para buscar a liderança aí, fez uma parceria com a Luna, unidade de saúde da GE, com tecnologia de densitometria óssea. A primeira iniciativa da parceria foi um programa com o nome Anlene (a marca dos produtos Fonterra que fazem bem para os ossos), que oferecia exames gratuitos de densitometria óssea em nove países da Ásia.
Usando a segunda lente, a Fonterra apostou no canal de distribuição dos serviços de alimentação como caminho para seu crescimento futuro. O resultado foi um negócio específico chamado Fonterra Foodservices, que oferece um conjunto completo de derivados de leite e soluções sob medida para profissionais do setor. O foco através da lente do canal de distribuição levou à estratégia de criação desse negócio único e integrado, do tipo “da vaca para o consumidor”.
3 - Visão: encontre um “gancho”
Após definir as áreas que focar, as conclusões devem ser resumidas em uma visão veemente e simples. A visão precisa equivaler a um chamado para que a organização alinhe esforços em torno de um objetivo claramente compreendido.
Na Fonterra, as visões-slogans eram “Winning through brands” (vencendo pelas marcas) e “Dairy for life” (na tradução livre, leite para a vida). Incluíam-se aí dois temas: o orgulho de ser fazendeiro –a Fonterra é uma cooperativa de agropecuaristas – e a ênfase da empresa em produtos naturais, representados pelas cores azul e verde do logo da empresa. Na Lipton, a visão foi “Painting the world yellow” (pintando o mundo de amarelo). A cor característica da marca representava o brilho da luz do sol e remetia a uma experiência mais ampla do que uma simples xícara de chá. Vale lembrar que a visão precisa ser lançada com certo estardalhaço.
4 - Pessoas: libere o potencial
O próximo passo é encontrar as pessoas certas e colocar nas mãos delas recursos desproporcionais. Diga-se que as pessoas certas são para todas as áreas da empresa –cadeia de fornecimento, P&D, marketing e vendas–, a fim de assegurar que se conte com as habilidades necessárias para vencer.
Na Kraft, mudanças significativas foram feitas no topo da hierarquia. Menos de dois anos depois de lançar a iniciativa de transformação organizacional, dois terços dos 30 principais líderes eram novos em seus cargos. Muitos deles eram de dentro da própria Kraft. Alguns foram recrutados no mercado e outros foram trazidos com a aquisição bem-sucedida da unidade de biscoitos do grupo Danone, em novembro de 2007. De forma semelhante, alguns gestores foram recrutados de empresas líderes no setor de bebidas (Coca-Cola, Pepsi, Schweppes), para alavancar a capacidade da Unilever de atuar no setor de alimentos.
Nas grandes empresas, o orçamento é um grande inimigo da criatividade. Os líderes se sentem automaticamente cerceados por restrições orçamentárias, reais ou percebidas, e “calam” sua imaginação. Para libertá-los disso, recomendamos uma abordagem contraintuitiva: dar às pessoas grandes objetivos (lucros, não apenas aumento de vendas) e –também– poder de fogo para alcançá-los, o que significa recursos virtualmente ilimitados. Embora isso pareça incentivar o desperdício, a meta de lucro induz o gasto “sábio”.
5 - Execução: esclareça e delegue
Aqui há dois elementos-chave:
• É preciso ser claro sobre quem vai fazer o quê, para evitar a ambiguidade sobre os papéis e as responsabilidades.
• O processo de tomada de decisão deve se aproximar dos clientes e consumidores – não do CEO.
Na Kraft, a responsabilidade pelas coisas estava fragmentada pelas várias áreas funcionais, mercados e unidades de negócios, mas o processo de tomada de decisão era altamente centralizado. Decisões como precificação do café na Alemanha eram tomadas na sede da empresa, por exemplo. Então, deu-se aos líderes dos negócios locais liberdade para tomar decisões ali. Para acelerar a execução, sugerimos:
• Demandar uma redução significativa no número de documentos e reuniões internas, que, quando excessivos, estimulam a paralisia da análise, promovem o foco voltado para dentro em detrimento do externo e enfatizam o passado, não o futuro.
• Adotar uma política de eliminação do PowerPoint nas apresentações; as reuniões geralmente se tornam mais produtivas se concentradas em discussões baseadas em leituras prévias.
6 - Organização: crie redes colaborativas
Iniciativas de crescimento raramente combinam com feudos organizacionais, seja por área funcional, região geográfica ou unidade de negócios. Precisam ser geridas por comunidades e redes que perpassem toda a companhia e sejam igualmente formais e informais.
Os biscoitos Oreo são bom exemplo disso. Eram uma marca forte nos Estados Unidos, mas tinham um perfil fraco no restante do mundo. Uma das razões era o pressuposto de que o que era bom para a Oreo nos Estados Unidos era bom para a China, para o Reino Unido ou para outros países. A empresa aprendeu que isso não era verdade. Para fazer a marca crescer na China, os biscoitos passaram a ser menos doces para agradar ao paladar local. A Kraft começou a dar mais atenção às promoções locais e a atividades específicas do mercado chinês.
Essas e outras decisões semelhantes foram possíveis porque a Kraft criou equipes de atuação global por categoria de produto. Tais equipes eram formadas por executivos de diferentes áreas e regiões do mundo e tinham por missão gerir marcas globais, inovação e cadeias de fornecimento abrangendo diferentes mercados.
7 - Métricas: reúna os números e conte histórias
Ao monitorar, devem-se escolher métricas simples, objetivas, que destaquem as prioridades de execução.
Na Kraft, a presidente Irene Rosenfeld pediu que as unidades de negócios criassem um scorecard de uma página que incluísse três parâmetros-chave: vendas, lucros e fluxo de caixa. Essas três medidas serviam de base para o pagamento de bônus para todos os funcionários. Isso reduziu bastante a complexidade dos relatórios e criou uma cultura clara de responsabilização pelos resultados.
A gestão do crescimento requer o foco nos números, mas eles sozinhos não bastam. Um esforço consciente deve ser feito para registrar por escrito e disseminar histórias de sucesso por trás dos números.
Como evitar armadilhas
Uma armadilha comum nesse processo é buscar ganhar escala antes de resolver problemas subjacentes. Por exemplo, é fácil se deixar seduzir pelo tamanho total de um mercado e esquecer a complexidade da distribuição ali. Outra armadilha potencial é negligenciar, ou gerenciar mal, as partes do negócio que não se encaixam nas áreas de foco central, a “cauda” do negócio: produtos, marcas, categorias e mercados que não fazem parte da lista de prioridades.
Além disso, manter um tom positivo é vital para o sucesso do crescimento com foco. Uma espiral negativa pode destruir o moral e fazer desandar a mudança. O sol gera uma quantidade enorme de energia, mas nos manda apenas uma leve sensação de todo esse calor. Um feixe de laser, por sua vez, com alguns quilowatts de energia, é capaz de cortar o metal. Esse é o poder do foco.
*Sanjay Khosla comanda a área de mercados em desenvolvimento e categorias globais da Kraft Foods. Mohanbir Sawhney é diretor do centro de pesquisa em tecnologia e inovação da Kellogg School of Management.
**Esta reportagem foi publicada pela Revista HSM Management e agora no Mundo do Marketing por meio de parceria que os dois veículos mantêm.
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