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quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O poder da loja e suas perspectivas


"O impacto crescente da internet e do comércio eletrônico no varejo também é um tema recorrente nas discussões estratégicas."



*\\* Postado por Alberto Serrentino - 09/11/2011


Em todo o mundo, há uma clara preocupação com o cenário econômico, seus possíveis desdobramentos da crise no consumo e, consequentemente, com os resultados futuros das empresas de varejo. As empresas americanas, por exemplo, têm atuado de maneira cautelosa e conservadora desde 2008, focando em redução de custos, aumento de produtividade, geração de caixa e expansão internacional.

O impacto crescente da internet e do comércio eletrônico no varejo também é um tema recorrente nas discussões estratégicas. Nesse aspecto, surgem cenários e hipóteses, com o questionamento frequente do papel que as lojas físicas terão no futuro, sobretudo em categorias em que o comércio eletrônico vem crescendo mais rapidamente, como livros, eletroeletrônicos e vestuário.

O assunto é complexo e merece ser analisado em diversos aspectos. De forma geral, é muito difícil imaginar que as lojas não continuarão a desempenhar um papel fundamental no consumo. É provável que a penetração dos canais digitais cresça e que em algumas categorias possa ser até mesmo dominante. Por outro lado, as lojas se reinventarão, buscando constantemente o elemento que garantirá sua sobrevivência e crescimento com rentabilidade: a relevância.

Ou seja, é preciso que haja clara definição de posicionamento e proposta de valor da marca, papéis dos canais e forma de entregar valor consistentemente ao longo do tempo para criar e realimentar os vínculos de confiança que mantêm os consumidores próximos às marcas. Para vislumbrar o papel e a transformação dos pontos de venda físicos no futuro é preciso segmentar a análise por setor, categoria de produtos, segmento de atuação da empresa e posicionamento. Os atributos que manterão a loja relevante são distintos e a experiência de compra decorrente, também.

Em operações de moda, as lojas cumprem um papel fundamental de construir imagens a partir de estilos de vida, valorização de produtos e histórias criadas com eles. Marcas como Abercrombie & Fitch, Uniqlo, H&M, Zara, Osklen e Le Lis Blanc não teriam alcançado o valor aspiracional que carregam sem as lojas e não poderão prescindir delas no futuro. Já em produtos eletrônicos e digitais a loja possibilita experimentação, descoberta e interação. A Apple Store foi um pilar fundamental para que a marca alcançasse o sucesso dos últimos anos.

As lojas permitem interação com produtos e pessoas e isso não vai perder atratividade, desde que se interpretem as transformações e se incorporem os recursos que o mundo digital permite desenvolver de forma integrada para operações multicanal.

Uma pesquisa realizada pela GS&MD – Gouvêa de Souza com consumidores em lojas de diversos segmentos e apresentada no 14º Fórum de Varejo da América Latina, em São Paulo, mostra oportunidades e desafios para repensar a loja e manter o negócio relevante. Conveniência e rotina são poderosos geradores de tráfego e conversão para as lojas, particularmente para categorias e formatos voltados a compras repetitivas e programadas.

Esse é o caso de supermercados e farmácias, em que 82% e 85% dos consumidores, respectivamente, vão à loja por proximidade de casa / trabalho ou por estarem passando em frente ao ponto de venda. A conversão é elevada – 92% para supermercados e 64% em farmácias – e a loja é vista como destino primário pela possibilidade de interagir com produtos e ter apoio e envolvimento de pessoas.

As oportunidades, nesses casos, estão em tornar a compra menos mecânica, racional e motivada por necessidade e obrigação; e, em vez disso, reforçar valorização de produtos, inclusão de serviços e criatividade em integração e desenvolvimento de novos formatos. Na Europa, por exemplo, vêm multiplicando-se modelos de drive-thru, como Real, Auchan, Carrefour e Continente. São lojas para retirada, com horário programado, de compras feitas via internet. É uma solução prática e simples para unir os mundos físico e digital e poupar tempo e esforço. Já a Eataly vem reinventando a experiência de comprar, vivenciar, aculturar-se e degustar alimentos em ambientes envolventes, estimulantes e emocionais.

Em eletroeletrônicos e digitais há motivações ligadas à experimentação de produtos e negociação de preços. A taxa de conversão é a mais baixa: 15%. As lojas precisam cada vez mais reforçar o contato físico com o produto, a orientação e edição da oferta e a agregação de serviços que permitam configurar soluções para os clientes. É o movimento que realizam Apple, Best Buy e Fast Shop. Já em produtos de moda, há muita descoberta, exploração de produtos e abertura para impulso. A conversão média é baixa (24%) e o grande desafio é capturar os shoppers pelo impacto e valorização de produtos, merchandising e experiência no ponto de venda.

Como gerar valor e relevância

Uma loja pode gerar valor e relevância a partir de distintos atributos.

Atributos emocionais - a capacidade de valorizar produtos que estimulem compras por impulso e cross merchandising; a construção de imagens atreladas a estilos de vida e personalidade; a possibilidade de transformar a experiência de compra em algo envolvente e prazeroso e a tangibilização de inovações em produtos e conceitos. A valorização de produtos é um elemento fundamental de atração das lojas. Saber selecionar, coordenar, expor, comunicar e embalar produtos modifica sensivelmente a percepção de valor. Algo que não é necessariamente restrito a produtos de moda ou sofisticados.

Redes de supermercados descobrem a resposta que mudanças na exposição de perecíveis e comida pronta geram nas vendas. Marcas de amplo alcance, como Zara, H&M e Uniqlo, transformam o valor dos produtos pelo seu tratamento no ponto de venda. No Brasil, C&A, Renner, Riachuelo e Marisa conseguem levar crescentemente atualidade, informação de moda e experiência de compras para um espectro abrangente de consumidores.

Atributos racionais - já no plano racional, as lojas se distinguem por amplitude e edição de sortimento; conveniência e praticidade; e por preços percebidos como mais competitivos que propostas de valor equivalentes. O fenômeno dos supermercados de descontos na Europa (como Aldi, Lidl e Netto) ou dos “atacarejos” brasileiros (Atacadão, Assai) mostram a força que propostas racionais claras podem ter. A oferta de produtos da Media Markt em eletroeletrônicos na Europa permite amplas comparações em todas as categorias.

Atributos híbridos há ainda atributos que mesclam razão e emoção, como agregação de serviços, soluções, experimentação e interação com pessoas. A Apple reinventou a experiência de compra de produtos eletrônicos e digitais e foi seguida por diversos operadores especializados. Nas lojas Apple, Best Buy, Currys ou Fast Shop é possível comparar, degustar, instalar e obter suporte para produtos que são commodities. Os serviços diferenciam a entrega da loja.

As oportunidades para desenvolvimento e expansão de lojas permitem segmentar e diversificar formatos para ocupar mais espaço. A britânica Tesco opera sob uma mesma bandeira hipermercados, supermercados, lojas de vizinhança, lojas de conveniência, catálogo e e-commerce. O grupo Inditex possui amplo portfólio de formatos de moda (Zara, Massimo, Dutti, Bershka, Oysho, Kiddy’s Class, Pull and Bear, Stradivarius), além da rede de móveis e acessórios Zara Home.

Esse movimento de segmentar e diversificar formatos vem se intensificando entre grandes grupos no Brasil. O Grupo Pão de Açúcar já opera uma diversificada plataforma de formatos e bandeiras, que inclui supermercados com posicionamentos distintos (Pão de Açúcar e Extra Supermercado), hipermercados, lojas especializadas em eletroeletrônicos e móveis (Casas Bahia, Ponto Frio), lojas de conveniência (Extra Fácil), postos de combustíveis, farmácias, além de canais de vendas digitais em e-commerce e m-commerce.

Recentemente a Renner adquiriu a rede especializada em presentes e produtos para casa Camicado, implantou um formato compacto e pilotos da loja monomarca Blue Steel. Já a Marisa implantou lojas especializadas em lingerie. O mercado brasileiro ainda tem espaço e oportunidades para desenvolvimento e expansão de redes de lojas. Empresas como Grupo Pão de Açúcar, Magazine Luiza, Máquina de Vendas, C&A, Renner, Riachuelo, Marisa, Drogasil, Pague Menos, Hering e Cacau Show expandiram suas redes em velocidade superior ao crescimento do mercado, ampliando participação e capilaridade.

As lojas continuarão a desempenhar um papel determinante para o varejo. A integração com os canais digitais torna-se imperativa e deve valorizar e fortalecer o ponto de venda físico. A busca da relevância pressupõe um profundo entendimento dos consumidores, de suas relações com as categorias e dos motivadores de compra. As compras acontecem por diversas motivações: necessidade, conveniência, impulso, desejo, oportunidade ou prazer. As lojas devem saber quais delas atender e com que atributos estimular escolhas. Os pontos de venda físicos devem incorporar o mundo digital e integrar o melhor de cada experiência para aproximar o cliente da marca.

*||* Alberto Serrentino é sócio sênior da GS&MD Gouvêa de Souza e autor do livro Inovações no Varejo: Decifrando o Quebra-Cabeça do Consumidor.
 

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