"Construir negócios “verdes”, formar parcerias com a cadeia produtiva, desenvolver produtos e serviços com o mínimo de impacto ambiental e apostar em propósitos são os caminhos."
*||=||* Por Bruno Garcia || 27/05/2013
Há alguns anos o termo sustentabilidade ganhou força e destaque na mídia, alertando para os prejuízos causados por modelos de negócios sem uma conexão com o meio ambiente, aspectos humanos e sociais. De início, o conceito acabou sendo muito utilizado em ações de Marketing para alardear atributos e valores que nem sempre refletiam a cultura organizacional dos anunciantes. Passados alguns anos, o conceito de sustentabilidade evoluiu para além do discurso a partir do momento que as marcas começaram a perceber que desenvolver modelos verdes pode ser um excelente negócio. Mas será que hoje já é possível definir uma marca como sustentável? E o mais importante: o que elas ganham com isso?
O princípio é simples: toda empresa cumpre uma função social. Mas ao contrário do que era imaginado no passado, as organizações deixam uma “pegada” ao cumprirem a sua função. Esta pegada pode ser traduzida em um impacto ambiental, econômico, social, cultural ou um misto de todos eles. As marcas passam a ser responsáveis por todas as etapas do processo produtivo na qual estão inseridas, desde a retirada de matéria prima até o descarte daquilo que foi consumido. Este novo espectro de atuação exige novas estratégias.
Os projetos ligados à sustentabilidade têm o objetivo de reduzir tais impactos, permitindo que a companhia continue a operar e crescer sem causar qualquer tipo de prejuízo. “As marcas do futuro serão aquelas que conseguirão integrar o conceito de sustentabilidade para dentro da sua forma de atuar”, explica Álvaro Almeida, Fundador da Report Sustentabilidade, empresa que organizou o Sustainable Brands.
Novo modelo é imprescindível para a sobrevivência
Repensar os modelos atuais é o primeiro passo para garantir a sobrevivência das marcas no futuro. Por esta razão, as empresas mais atentas e com visão de longo prazo vêm modificando seus processos e até mesmo engajando os demais parceiros de suas cadeias produtivas para estabelecer metas que vão desde mudanças na matriz energética até o desenvolvimento de produtos que gerem zero descarte para o meio ambiente. A mudança não se dá apenas por conta da pressão exercida pela sociedade e pelos governos, mas principalmente por uma questão de adaptação.
A Brasil Kirin, por exemplo, vem transformando seus processos internos e os resultados estão aparecendo. A companhia reduziu em 20% o consumo de água em suas fábricas, em 10% o consumo de energia elétrica e em 70% o desperdício de materiais, graças à reciclagem de embalagens. Existe também um projeto de verticalização da produção de energia e a ideia é que a companhia produza o suficiente para abastecer suas plantas industriais. A previsão é de que pelo menos um terço deste volume de energia venha de fontes renováveis, com a aeólica. Além de reduzir seu impacto, a empresa economiza e se antecipa a regras cada vez mais rígidas ligadas ao seu desempenho.
Isso remete a um outro conceito de sustentabilidade envolvendo marcas: o lucro gerado por elas não pode ser voltado apenas para os acionistas. Uma companhia sustentável deve gerar resultado também para o ecossistema no qual está inserida, como contrapartida aquilo que ela retira deste mesmo ecossistema para manter sua operação. “Estas marcas serão protagonistas na construção do futuro. Uma companhia não pode gerar lucro apenas para os acionistas, mas para todo o ecossistema. Esta revolução é possível e acima de tudo, é um excelente negócio. Esta é uma perspectiva nova que está revolucionando a maneira de conduzir as empresas”, destaca Fred Gelli, Co-fundador e Diretor de Criação da Tátil Design de Ideias.
Marcas sustentáveis ainda estão em construção
A lógica foi apresentada por Gelli durante a conferência Sustainable Brands, ocorrida nos dias 8 e 9 de maio no Rio de Janeiro, e tem como pressuposto a busca do equilíbrio entre organizações e o ambiente a sua volta. A saída é balancear as expectativas do trimestre com visões de médio e longo prazo. “Isso já acontece, mas acredito que o que vai movimentar este mercado de fato é o instinto de sobrevivência, pois é isso que faz as espécies evoluírem quando olhamos para os exemplos dados pela própria natureza. O consumidor está mais consciente e os recursos estão mais caros. Será cada vez menos vantajoso para as companhias gerar impacto ambiental. Hoje não pagamos o preço verdadeiro pelas coisas. É um ‘roubo no jogo’ que desequilibra o sistema”, explica o Diretor de Criação da Tátil.
Como se trata de um processo ainda em andamento, alguns defendem que as verdadeiras marcas sustentáveis ainda são uma visão de futuro, pois no cenário atual elas ainda se encontrariam na metade do caminho. “Saberemos no futuro, pois as empresas verdadeiramente sustentáveis ainda estarão por aqui. Não falamos em marcas sustentáveis hoje, mas temos companhias que estão construindo uma base para se tornarem sustentáveis. Este é o movimento que estamos vivendo e entendemos que essas empresas são poderosas porque mobilizam e engajam as pessoas. Elas são capazes de fazer este movimento, associando produtos e serviços a um propósito”, diz Álvaro Almeida, Fundador da Report Sustentabilidade.
O conceito do lucro também começa ser questionado, não como algo nocivo, mas sim como um ponto necessário para que as empresas busquem outro objetivo, o da prosperidade econômica. “A prosperidade pressupõe algo muito além do simples lucro. A peformance de um produto, serviço ou negócio é sustentável se ele obedece a critérios que preservem a sua evolução no que diz respeito a pessoas, ambiente e a prosperidade da empresa”, afirma Silvio Meira, Cientista-chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (C.E.S.A.R).
Sustentabilidade como vetor de inovaçãoO tema sustentabilidade também deve estar inserido na cultura das organizações, permitindo que a equipe tenha um foco diferenciado no desenvolvimento de produtos e serviços. Na Natura, o tema se tornou um valor a ser perseguido por todo o time, o que garante também à marca bons resultados no quesito inovação. O pontapé inicial para a mudança foi o lançamento da marca Ekos, em 2000. “Este foi um divisor de águas, pois esta marca foi totalmente pensada a partir do princípio da biodiversidade. O conceito deu tão certo que nos anos seguintes ele foi expandido para toda a empresa“, afirma Denise Alves, Diretora de Sustentabilidade da Natura, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Um dos passos foi vegetalizar todos so produtos, eliminando o uso de compostos animais ou sintéticos na produção. Em 2008, a empresa também eliminou o álcool tradicional, substituindo tudo pelo álcool orgânico, uma mudança radical na categoria de perfumaria, que responde por 50% do negócio da Natura. Um novo passo foi dado com a marca Sou, lançada este mês, que segue um conceito de desperdício mínimo de insumos e materiais. Com um design diferenciado, as embalagens utilizam 70% menos plástico e a produção emite 60% menos CO2. Há também economias de escala ligadas ao transporte e estoque dos itens.
Da mesma forma que Ekos iniciou uma mudança na forma de pensar e atuar da empresa, a Natura espera o mesmo com Sou, pouco a pouco transferindo seu conceito para os demais produtos de seu portfólio. “Nosso foco é a redução do desperdício e na produção de linhas enxutas que tragam para o consumidor aquilo que realmente é essencial. Assim as marcas podem ser agentes de transformação. Não adianta falar de sustentabilidade em uma organização se não for através do negócio e das marcas”, complementa Denise Alves.
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